Matéria veiculada no portal www.informativoequestre.com.br traz matéria de Cláudio Haddad, da Revista Horse, sobre o manejo de equinos através do pastejo rotacionado. Confira abaixo a íntegra da matéria e sua autoria.
O Pastejo Rotacionado é a
modalidade de exploração da pastagem onde, para uma carga animal fixa,
respeita-se um período de ocupação (PO) seguido de um período de
descanso (PD).
O contraponto do Pastejo Rotacionado é o Pastejo Contínuo, onde o
responsável pelo manejo vai adequar a carga animal à capacidade
produtiva do pasto. No Pastejo Contínuo, os animais permanecem o tempo
todo na área, variando o número de animais em relação à produção de
massa da forrageira (verão e inverno).
Na Natureza, os herbívoros têm à disposição grande quantidade de área
para pastejo, e mesmo assim apresenta uma elevada mobilidade,
pastejando diferentes pontos e em grandes rebanhos. É o caso dos gnus,
zebras e impalas na África, os caribus e renas no hemisfério norte e
núcleos de cavalos e jumentos selvagens espalhados em diferentes
reservas ao redor do planeta.
Todos esses animais procedem um “Pastejo Rotacionado” com variáveis
lotações, com algumas espécies trabalhando em parceria (associativismo),
como ocorre na África.
Assim sendo, zebras preferem pastos mais altos e gnus e gazelas as
pastagens em rebrota, formando uma associação seqüencial e simultânea,
onde todas as espécies se beneficiam mutuamente, com reflexos positivos
para o ambiente forrageiro.
Completam essa magnífica sociedade, o trabalho dos besouros
(vira-bosta), térmites (cupins) e anelídeos (minhocas) mineralizando a
matéria orgânica dos dejetos, afofando e descompactando o solo.
Ao domesticar as espécies, o homem inicialmente acompanhou as rotas
migratórias naturais (nomadismo), posteriormente a posse da terra
(obrigou a cercá-la) e cerceando os movimentos dos herbívoros, foi
obrigado a aperfeiçoar o Pastejo Rotacionado visando exploração racional
da área.
De todos os herbívoros domésticos, o cavalo é aquele que apresenta os
piores comportamentos em pastejo, provocando frequentemente mudanças
drásticas na comunidade forrageira.
Listaremos a seguir diferentes aspectos desse comportamento e suas conseqüências.
1- Cavalos são altamente seletivos em pastejo, apreciando
sobremaneira as forragens mais tenras e suas folhas mais novas. Exercem
uma desfolha enérgica na forragem, pois a motilidade dos lábios prende a
forragem com precisão, e a ação dos dentes incisivos superiores e
inferiores procedem ao corte rente ao solo. Quanto mais rente for o
corte, maior a intensidade da desfolha, e consequentemente maior é o
dano à planta forrageira.
É por isso que as melhores pastagens para eqüinos tendem a “gramar” o
terreno, ou seja, as espécies apresentam crescimento estolonífero e/ou
rizomatoso e a desfolha é menos sentida pela planta.
Ainda assim, se mantivermos os cavalos durante um longo tempo sobre a
área de pastagem, haverá uma tendência irreversível de pastejar as
áreas de brota, causando mais dano à forrageira, e levando-a ao
esgotamento de suas reservas. Essa é a principal razão da não
recomendação do Pastejo Contínuo para eqüinos. Mas não é a única.
2- Cavalos sempre elegem uma fração do piquete para maior
intensidade de defecação, e essas áreas são conhecidas tecnicamente como
“bosteiros”. Esse comportamento também existe na natureza e é explicado
como uma defesa do animal à reinfestação verminótica, uma vez que o
“bosteiro” é pouco ou nada pastejado. Então, se o responsável pelo
manejo do pasto desconhecer essa particularidade, irá sempre interpretar
que há pasto disponível, mas o cavalo exercerá o super-pastejo (comendo
a brota da forrageira) longe da área de dejetos. Consequentemente, as
áreas sub pastejadas se apresentarão maduras e fibrosas, diminuindo
ainda mais o interesse do cavalo
O resultado é um piquete apresentando áreas super e sub-pastejadas, acelerando a degradação do mesmo.
Quanto a um Pastejo Rotacionado ideal, os piquetes têm período de
ocupação rápido (no máximo uma semana), seguido do período de descanso,
onde existe a roçada de igualação e adubação rotineiramente.
A ação da roçadora espalha os montes de fezes, o adubo devolve a
fertilidade exportada e o descanso vai mascarar os odores de fezes para o
próximo ciclo de pastejo e permitir recuperação da planta forrageira.
A rotina então é a seguinte:
ocupa – descansa – roça – aduba
Também no período de descanso, a não presença de animais permite um
controle mais efetivo dos vermes, além de se constituir em uma “janela”
para controle de pragas, ervas daninhas e doenças da forrageira.
Nesse período de descanso, ocorrerá a mineralização da matéria
orgânica das fezes, tornando-a rica em nutrientes disponíveis e isenta
de odor. Cada espécie forrageira tem um período determinado de descanso e
atualmente recomenda-se o retorno ao pastejo quando a interceptação
luminosa da área atingir 95%.
O maior indicador que o manejo da pastagem está incorreto é a
presença visível de áreas sub e super-pastejadas, aliado os “murunduns”
característicos da área de defecação. Os “murunduns” refletem a área
onde caíram as fezes e que não foi pastejada pelo cavalo. Não havendo
período de descanso, roçada e adubação, os “murunduns” vão se
caracterizando mais intensos na coloração verde e no desenvolvimento da
forragem.
Na Europa e EUA, procede-se o pastejo associado entre cavalos e
ruminantes (ovelhas e/ou gado Jersey). Os ruminantes não rejeitam a área
de bosteiro (nem os murunduns), consumindo-a normalmente. Como é
difícil a inoculação verminótica cruzada, vermes do cavalo ingeridos
pelos ruminantes não completam o ciclo.
O contrário também ocorre. Cavalos consomem áreas onde houve dejetos
de ruminantes, e pela mesma dificuldade de inoculação cruzada, ambas
espécies “limpam” o terreno de vermes.
Para tanto, a relação normalmente utilizada é de 10 éguas: 1 vaca ou 10 éguas: 5 ovelhas.
3- Cavalos apresentam intensa movimentação nos piquetes. Correr
livremente é manifestação de saúde e alegria do eqüino. Excessão feita
às éguas nos dois últimos meses de gestação, todas as demais categorias
do plantel correm pela pastagem, inclusive éguas recém-paridas
acompanhando a movimentação de seus potros. Essa intensa movimentação
age de forma deletéria à forrageira, ou como se diz na prática, o
“cavalo come com uma boca e quatro cascos”.
A ação nociva dessa movimentação exige uma forrageira vigorosa e
agressiva, capaz de regenerar falhas e erosão e isso é devidamente
auxiliado pelo descanso e adubação.
4- Cavalos erroneamente alimentados tendem a permanecer tempo excessivo nos cantos dos piquetes.
Nesse caso é preciso diferenciar a natural permanência relativamente
curta causada pela curiosidade do animal ao que está ocorrendo em áreas
de outros piquetes, e carreadores daquela onde o excesso é notado
facilmente.
Quando o nível de alimentação com concentrados é alto, o excesso de
energia causa efeito substituição no regime alimentar do cavalo. Em
outras palavras, quanto mais ração fornecida a pasto, menor é o consumo
do pasto e maior a permanência nas cantoneiras.
Em haras de PSI é comum o fornecimento excessivo de aveia grão
(energia) e nota-se o comportamento de “boi sonso” exibido pelos animais
nas quinas dos piquetes. Esse comportamento caracteriza-se por
sonolência, aparência cabisbaixa e imobilidade. Recomenda-se então a
diminuição do nível energético da dieta, o correto manejo Rotacionado do
pasto, e a colocação de “cama de cocheira” in natura (fezes + urina +
cama) sem curtir nos cantos do piquete.
O odor dos dejetos vai fazer o cavalo evitar as quinas e a menor energia em ração provocará maior tempo de pastejo na área.
Finalizando, o pastejo rotacionado é fundamental para a mantença do equilíbrio eqüino saudável – pastagem vigorosa.
Somente com a aplicação dos princípios técnicos descritos é possível
criar cavalos de alto potencial genético, utilizando pastagens de alto
valor nutricional e com sensível redução nos custos.
Claudio Haddad
é Engenheiro Agrônomo, MS Nutrição Animal e
Pastagens e Doutor em Agronomia pela Escola Superior de Agricultura
Luiz de Queiroz-USP. Professor Associado do Departamento de Zootecnia da
ESALQ-USP, co-autor do Sistema Brasileiro de Criação de Equinos, autor
de diversos livros e publicações, consultor técnico para área de
Pastagens e Nutrição de Equinos.
onte: Revista Horse